Daniel Martins de Barros
Depois de anos de procrastinação –
o adiamento da realização de tarefas necessárias indefinidamente –
descobrimos que outro problema nos ronda: a precrastinação. Mas
antecipar tarefas desnecessariamente pode ser só uma forma de continuar
adiando o que realmente precisa ser feito.
Lembra-se da piada que rodou pelas redes sociais há algum
tempo? “Se um homem diz que vai consertar alguma coisa em casa, ele vai!
Não precisa ficar lembrando a cada seis meses.” Acho que é uma das mais
precisas e divertidas traduções do conceito de procrastinação: adiar a
realização de tarefas necessárias indefinidamente, ou até que elas sejam
inadiáveis.
Muita gente confunde procrastinação com preguiça, mas embora
semelhantes elas não são sinônimos. A falta de motivação suficiente para
se engajar numa atividade, geralmente chamada de preguiça, explica
porque deixamos algumas coisas para depois, mas não explica tudo. Há
tarefas que adiamos por medo – acreditamos, conscientemente ou não, que
somos incapazes de dar conta e por isso pospomos o quanto podemos. Ainda
na esfera inconsciente podemos simplesmente não querer ajudar as
pessoas que precisam daquele trabalho, e as punimos com uma espera de
Penélope. Ou ainda a questão nos aflige tanto – como pagar contas e ver
que o dinheiro está curto – que simplesmente fugimos. De qualquer forma,
a procrastinação nos incomoda, e enquanto não nos livramos da carga
mental do trabalho inconcluso uma sombra persegue nossas consciências.
É aí que surge a precrastinação. O termo foi cunhado no ano passado,
quando psicólogos depararam-se com um comportamento que não esperavam
durante um experimento. Eles pesquisavam se voluntários prefeririam
carregar um balde pesado por uma distância curta ou um balde leve por um
trecho longo. Nos testes prévios, contudo, com baldes de mesmo peso,
num corredor em que havia um balde perto da largada e outro da chegada,
as pessoas tendiam e a pegar o primeiro, mais perto delas, mesmo que
isso correspondesse a um esforço extra. Normalmente elas explicavam que
queriam se livrar logo do teste, e tinham a sensação de que pegar o
primeiro balde ajudava a tirar da mente o dever. A partir daí surgiu o
conceito de precrastinação, que corresponde a antecipar a realização
tarefas desnecessariamente, o que pode levar a estratégias menos
eficientes. A ansiedade seria sua principal causa, o que a colocaria no
polo oposto ao da desmotivação, fazendo precrastinação e procrastinação
serem antônimos.
De fato, aparentemente são fenômenos opostos: o precrastinador não
deixa para amanhã o que pode fazer hoje enquanto o procrastinador não
deixa para amanhã o que pode fazer depois de amanhã. No entanto, quando
nos voltamos para a vida real, vemos que sim, é comum nos preocuparmos
antecipadamente com coisas distantes, e não raramente nos envolvemos em
tarefas que poderiam ser adiadas. Mas elas usualmente são obrigações
menores que colocamos na frente do que realmente precisamos fazer: vamos
checar e responder aqueles e-mails antes de preparar o texto que foi
encomendando, arrumamos a mesa e as gavetas antes de começar o trabalho
efetivo do dia, passamos horas organizamos todos os livros antes de nos
lançarmos à realização da pesquisa e assim por diante. No fundo, a
precrastinação é só uma maneira de continuarmos adiando o que não
queremos fazer, mas fugindo do desconforto aos nos convencer de que
estamos trabalhando.
Uma das maneiras de se livrar dos dois problemas é fazer listas e
cronogramas. Não é hábito em nossa cultura, ao contrário dos americanos,
por exemplo, mas é fato que visualizar as obrigações e seus prazos
ajuda na organização e na escolha de estratégias mais eficientes. Outra
é tentar entender melhor o que está acontecendo. Por que está tão
difícil começar aquele trabalho? Estou inseguro? Com raiva do chefe? Ou
simplesmente não acredito em sua relevância? Trazer à consciência as
razões subjacentes é um passo fundamental para mudar o comportamento.
Por fim, é possível criar sinais de alerta pessoais. Eu, por exemplo,
toda vez que resolvo checar se não tem nada importante perdido na minha
caixa de spam, sei que estou enrolando para fazer algo. E nessa época de
facebook, whatsapp e afins, nada mais fácil do que encontrar uma
maneira de enganar o cérebro para que ele pense que está ocupado.
E você, qual estratégia usa para fingir para si mesmo que está trabalhando quando está, no fundo, fugindo do trabalho?
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