sábado, 25 de abril de 2015

Entre a preguiça e a ansiedade


Daniel Martins de Barros

Depois de anos de procrastinação – o adiamento da realização de tarefas necessárias indefinidamente – descobrimos que outro problema nos ronda: a precrastinação. Mas antecipar tarefas desnecessariamente pode ser só uma forma de continuar adiando o que realmente precisa ser feito.

Lembra-se da piada que rodou pelas redes sociais há algum tempo? “Se um homem diz que vai consertar alguma coisa em casa, ele vai! Não precisa ficar lembrando a cada seis meses.” Acho que é uma das mais precisas e divertidas traduções do conceito de procrastinação: adiar a realização de tarefas necessárias indefinidamente, ou até que elas sejam inadiáveis.
Muita gente confunde procrastinação com preguiça, mas embora semelhantes elas não são sinônimos. A falta de motivação suficiente para se engajar numa atividade, geralmente chamada de preguiça, explica porque deixamos algumas coisas para depois, mas não explica tudo. Há tarefas que adiamos por medo – acreditamos, conscientemente ou não, que somos incapazes de dar conta e por isso pospomos o quanto podemos. Ainda na esfera inconsciente podemos simplesmente não querer ajudar as pessoas que precisam daquele trabalho, e as punimos com uma espera de Penélope. Ou ainda a questão nos aflige tanto – como pagar contas e ver que o dinheiro está curto – que simplesmente fugimos. De qualquer forma, a procrastinação nos incomoda, e enquanto não nos livramos da carga mental do trabalho inconcluso uma sombra persegue nossas consciências.
É aí que surge a precrastinação. O termo foi cunhado no ano passado, quando psicólogos depararam-se com um comportamento que não esperavam durante um experimento. Eles pesquisavam se voluntários prefeririam carregar um balde pesado por uma distância curta ou um balde leve por um trecho longo. Nos testes prévios, contudo, com baldes de mesmo peso, num corredor em que havia um balde perto da largada e outro da chegada, as pessoas tendiam e a pegar o primeiro, mais perto delas, mesmo que isso correspondesse a um esforço extra. Normalmente elas explicavam que queriam se livrar logo do teste, e tinham a sensação de que pegar o primeiro balde ajudava a tirar da mente o dever. A partir daí surgiu o conceito de precrastinação, que corresponde a antecipar a realização tarefas desnecessariamente, o que pode levar a estratégias menos eficientes. A ansiedade seria sua principal causa, o que a colocaria no polo oposto ao da desmotivação, fazendo precrastinação e procrastinação serem antônimos.
De fato, aparentemente são fenômenos opostos: o precrastinador não deixa para amanhã o que pode fazer hoje enquanto o procrastinador não deixa para amanhã o que pode fazer depois de amanhã. No entanto, quando nos voltamos para a vida real, vemos que sim, é comum nos preocuparmos antecipadamente com coisas distantes, e não raramente nos envolvemos em tarefas que poderiam ser adiadas. Mas elas usualmente são obrigações menores que colocamos na frente do que realmente precisamos fazer: vamos checar e responder aqueles e-mails antes de preparar o texto que foi encomendando, arrumamos a mesa e as gavetas antes de começar o trabalho efetivo do dia, passamos horas organizamos todos os livros antes de nos lançarmos à realização da pesquisa e assim por diante. No fundo, a precrastinação é só uma maneira de continuarmos adiando o que não queremos fazer, mas fugindo do desconforto aos nos convencer de que estamos trabalhando.
Uma das maneiras de se livrar dos dois problemas é fazer listas e cronogramas. Não é hábito em nossa cultura, ao contrário dos americanos, por exemplo, mas é fato que visualizar as obrigações e seus prazos ajuda na organização e na escolha de estratégias mais eficientes. Outra é tentar entender melhor o que está acontecendo. Por que está tão difícil começar aquele trabalho? Estou inseguro? Com raiva do chefe? Ou simplesmente não acredito em sua relevância? Trazer à consciência as razões subjacentes é um passo fundamental para mudar o comportamento. Por fim, é possível criar sinais de alerta pessoais. Eu, por exemplo, toda vez que resolvo checar se não tem nada importante perdido na minha caixa de spam, sei que estou enrolando para fazer algo. E nessa época de facebook, whatsapp e afins, nada mais fácil do que encontrar uma maneira de enganar o cérebro para que ele pense que está ocupado.
E você, qual estratégia usa para fingir para si mesmo que está trabalhando quando está, no fundo, fugindo do trabalho?

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